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10.03.2021
Relações UE-China - Rumo a uma Parceria Justa e Recíproca
«Para ter princípios, primeiro é necessário ter coragem» – provérbio chinês
Os antigos imperadores chineses alegavam que o seu mandato para governar tinha sido conferido por uma entidade sobrenatural. Acreditavam que o divino tinha consagrado a China como o «Império do Meio», o centro do mundo, o império mais poderoso, harmonioso, rico e sábio que jamais existira. As narrativas contemporâneas, popularizadas pelo Partido Comunista Chinês, baseiam-se fortemente no passado. Estas narrativas salientam que a China foi o centro do mundo durante cinco mil anos, até sofrer uma perturbação contranatura da «ordem sagrada» provocada por potências ocidentais. Hoje, os dirigentes chineses prometem devolver à China o estatuto que alegadamente merece, restabelecendo assim a ordem «natural» do mundo.
Tal como todas as narrativas históricas, a narrativa chinesa é uma compilação de factos comprovados e de alegações ideológicas. O conceito segundo o qual a China tem «mais história» do que os outros países não é apoiado pela investigação arqueológica. Além disso, a história da China apresenta períodos de poder, declínio, reinos beligerantes, domínio estrangeiro e mudanças fundamentais decorrentes de ideias e influências estrangeiras. A reivindicação de um mandato divino por um partido cuja ideologia é inspirada em Marx, Lenin, Mao, Deng e, agora, Xi é mais do que questionável.
As narrativas históricas transformadas em ideologia nacional-comunista não podem definir as relações na ordem multilateral assente em regras do século XXI. Esta pode ser uma faca de dois gumes, uma vez que todos os países podem reivindicar diferendos historicamente «comprovados» em relação aos seus vizinhos. Os mapas desenhados há muitos séculos não podem prevalecer sobre o direito internacional no que se refere à definição de fronteiras e do domínio territorial, se quisermos preservar a paz e uma cooperação leal entre os nossos vizinhos da Europa e da Ásia.
A China, com a sua atribulada história, cultura e filosofia ricas, assim como artesanato inovador, tem sido, desde há muitos séculos, objeto de fascinação, inspiração e aspiração, sincera ou não, dos europeus.
***
Em março de 2019, a Comissão Europeia qualificou a República Popular da China como um parceiro de cooperação, um parceiro de negociação com interesses contraditórios, um concorrente económico e um rival sistémico.
Tendo em conta as consequências políticas da pandemia de COVID-19 e a imposição da chamada Lei de Segurança Nacional em Hong Kong, uma prossecução mais agressiva dos objetivos a longo prazo em relação a Sinquião, ao Tibete e a Taiwan, o desrespeito demonstrado pelo sistema multilateral e pelos acordos internacionais, a disseminação da influência mal-intencionada chinesa e o incumprimento das obrigações em matéria de direitos humanos fundamentais, consideramos obsoleta esta abordagem baseada em quatro vertentes. Enquanto parceiro da União Europeia, a China deve respeitar as suas próprias obrigações internacionais, o que ainda não acontece. A rivalidade sistémica pode ser considerada cada vez mais o paradigma dominante nas nossas relações, apesar de não podermos ignorar a necessidade de prosseguir o diálogo com a China.
Devemos reconhecer as atitudes cada vez mais assertivas da atual liderança chinesa, que abandonou o método de liderança coletiva e adotou um renovado culto da personalidade. A luta global entre democracia e autoritarismo é um fator determinante da nossa relação com a China, por conseguinte, o espaço para a cooperação e o intercâmbio económico é mais reduzido.
Em 2020, a China foi o principal parceiro comercial da UE, o que não deixa qualquer dúvida de que as relações económicas e comerciais devem estar no centro da cooperação entre a UE e a China, mas não devem ser o único fator determinante. Todavia, as vantagens não são equilibradas. As duas partes não estão de acordo sobre a questão fundamental dos valores e das normas em que foi fundada a atual ordem internacional do pós-guerra. A Europa baseia-se no respeito pela democracia, pelo Estado de direito e pelos direitos humanos, ao passo que a China é um Estado autoritário monopartidário. Porém, devemos tentar maximizar os benefícios da nossa interdependência económica e fazer frente aos desequilíbrios existentes.
As empresas europeias estão alarmadas com a deterioração do clima empresarial e com a concorrência cada vez mais desleal das empresas chinesas, tanto na China como noutros países. Esta situação tem sido acompanhada por uma abordagem mais conflituosa na diplomacia chinesa em relação a cada Estado-Membro e à União Europeia. As universidades, os investigadores, os jornalistas e os intervenientes da sociedade civil europeus enfrentam pressões, censuras e ameaças não só quando trabalham na China, mas também quando desenvolvem as suas atividades na Europa. Tal ocorre quando as autoridades chinesas constatam que as suas doutrinas e políticas oficiais são postas em causa, o que tem um efeito direto na proliferação dos valores europeus e nas condições justas e equitativas para as empresas e os cidadãos.
Os cidadãos europeus sentem que assertividade e a presença crescente da China nos Estados-Membros põem em risco o estilo de vida europeu. A Europa receia que a ausência de uma regulamentação transparente, justa e equitativa prejudique a concorrência e tenha um impacto mais negativo do que positivo na vida dos seus cidadãos.
A cooperação para resolver os problemas globais
Tendo em conta estes desafios, pretendemos cooperar com a China em domínios de interesse comum. Com uma população de 1,4 mil milhões de habitantes que representam um vasto mercado, uma das três maiores economias mundiais, um dos países mais ricos do mundo, o maior exportador mundial – bem como uma potência nuclear e um membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas –, a China é um parceiro indispensável para fazer frente aos desafios mundiais.
O país é agora um parceiro estratégico da UE na luta contra as alterações climáticas e na transição mundial para fontes de energia renováveis. A China faz parte do Acordo de Paris desde 2016, embora seja atualmente o maior produtor mundial de gases com efeito de estufa e dióxido de carbono (quase 30 % das emissões mundiais). Solicitamos, por conseguinte, que o Governo chinês honre o compromisso assumido e esperamos que reduza as emissões até 2030 e que atinja a neutralidade carbónica até 2060. Oferecemos cooperação industrial para desenvolver soluções de alta tecnologia, em particular no domínio do hidrogénio verde. A UE também apoia a cooperação com Pequim para garantir a estabilidade e o crescimento sustentável nos países em desenvolvimento. Porém, as diferenças sistémicas e uma abordagem estritamente utilitarista, muitas vezes assumida pelas autoridades chinesas, impediram até à data estas iniciativas. Por conseguinte, opomo-nos veementemente à abordagem insustentável adotada pela China em matéria de cooperação com a União Africana e os países africanos nos domínios do acesso às matérias-primas, da exploração de novos mercados, dos direitos humanos e das questões ambientais e climáticas.
Ambas as partes consideram a luta contra o terrorismo internacional outro domínio potencial de cooperação. Contudo, a definição de terrorismo aplicada pela legislação e jurisdição chinesas é vaga. Ademais, as acusações de terrorismo são frequentemente utilizadas de forma arbitrária e retroativa contra manifestantes pacíficos e defensores dos direitos das minorias, como é cada vez mais evidente em Sinquião, no Tibete e em Hong Kong. Por conseguinte, enquanto estas práticas existirem, a cooperação em matéria de luta contra o terrorismo será limitada.
Não obstante as nossas diferenças, devemos continuar a empenhar-nos num diálogo estruturado com a China para fazer face aos desafios globais, como as alterações climáticas, a migração ilegal, o regresso a um regime comercial e de arbitragem assente em regras no âmbito da OMC, bem como a introdução de mecanismos eficazes para regulamentar os mercados financeiros. Uma grande parte destes desafios depende, todavia, da disponibilidade da China para respeitar as normas e regras internacionais.
A defesa da ordem internacional assente em regras
O comércio internacional e o acesso a novos mercados melhoraram significativamente o nível de vida das pessoas em todo o mundo e contribuíram para a criação de emprego, o aumento da prosperidade e a redução da pobreza mundial. Continuamos, por isso, empenhados em construir um sistema de comércio mundial aberto e justo, moldado por uma ordem multilateral assente em regras e com valores democráticos no seu núcleo. Para alcançar este objetivo, a UE deve trabalhar de forma construtiva com os seus parceiros.
A China continua a proclamar que a pedra angular da sua política externa é o apoio a um mundo multipolar e a uma ordem internacional assente em regras. O Presidente Xi Jinping salientou reiteradamente a importância da ordem mundial multilateral, em particular num discurso marcante realizado em Davos, em 2017:
«É verdade que a globalização económica criou novos problemas. No entanto, esta não é uma justificação para rejeitarmos completamente a globalização económica. Pelo contrário, devemos adaptar-nos à globalização e orientá-la, atenuar o seu impacto negativo e garantir que os seus benefícios são partilhados por todos os países e todas as nações.»
Não podemos ignorar o facto de o apoio declarado da China a um mundo multipolar e o compromisso relativo a uma ordem assente em regras não resistirem a um escrutínio rigoroso. Nas organizações internacionais, Pequim tende a aplicar as regras comuns apenas quando estas servem os seus interesses, caso contrário, declara-as inadequadas às suas necessidades específicas, ou ignora-as e aplica as suas interpretações arbitrárias. Os desenvolvimentos relativos à OMC, à OMS e ao Tribunal Internacional do Direito do Mar demonstram como a legitimidade destas organizações internacionais está a ser prejudicada. Consequentemente, a sua capacidade para resolver conflitos bilaterais num contexto multilateral é reduzida.
Ao mesmo tempo, a política externa chinesa tornou-se mais assertiva e a sua diplomacia mais agressiva, em particular sob a liderança de Xi Jinping. A nível mundial, a China pretende desempenhar um papel cada vez mais importante, que reflita o seu rápido desenvolvimento. Os diplomatas chineses substituíram a máxima de Deng Xiaoping «esconder a força e aguardar o momento» por uma «diplomacia do lobo guerreiro».
A chamada Lei da Segurança Nacional de Hong Kong constitui uma violação do compromisso assumido pela China na declaração conjunta sino-britânica de 1984, que consagra o princípio «um país, dois sistemas» para Hong Kong. A nova lei põe em causa não só os acordos internacionais em vigor, mas também a autonomia e as liberdades há muito consolidadas em Hong Kong. Desde a entrada em vigor da lei, o respeito pelos direitos humanos na cidade deteriorou-se rapidamente. A nova lei é um instrumento que permite silenciar dissidentes, realizar detenções em massa de ativistas pró-democracia, suprimir a liberdade de expressão e de reunião e visar jornalistas e académicos.
Taiwan, a 7.ª maior economia da Ásia, dotada de uma democracia pluralista estável, representa, para Pequim, uma «província renegada». O Presidente Xi Jinping estabeleceu que o ano 2049, centenário da fundação da República Popular da China, seria o prazo para a «reunificação» da República Popular da China e da República da China por quaisquer meios, o que é simultaneamente desestabilizador e perigoso. O Grupo PPE manifesta a sua profunda preocupação com a intensificação das manobras militares da China contra Taiwan, que constituem uma séria ameaça para a paz e a estabilidade regionais e reitera a sua posição de que ambas as partes se devem abster de realizar ações unilaterais e de recorrer ao uso da força. Acreditamos que a unificação de Taiwan e da China – se chegar a acontecer – deve ser apenas o resultado da vontade democrática do povo de Taiwan e da República Popular da China.
O Grupo PPE está empenhado em defender a ordem multilateral assente em regras e o primado do Estado de direito nas relações internacionais. As organizações internacionais que estão no cerne desta ordem devem igualmente adaptar-se a um mundo em constante mutação. Este objetivo só poderá ser alcançado mediante negociações multilaterais com a participação e representação equitativas de todas as partes interessadas.
Rivalidade sistémica – defender os interesses europeus
A UE e a República Popular da China estabeleceram laços diplomáticos em 1975 e, no decorrer destes 46 anos, ambas as partes desenvolveram uma estreita relação política, económica e cultural, baseada num diálogo de elevado nível. Desde os primeiros dias da «reforma e abertura» da China ao mundo exterior, as empresas, engenheiros e universidades europeus contribuíram para o desenvolvimento do país através do investimento, da tecnologia e da investigação, juntamente com uma ajuda significativa ao desenvolvimento por parte da UE. Este compromisso foi motivado pelo pressuposto de que a China acabaria por liberalizar o seu sistema económico e possivelmente também a sua política. Esperávamos uma transição para uma economia de mercado e uma abertura gradual ao intercâmbio económico, científico e cultural sem entraves.
Hoje, temos de reconhecer que os nossos desejos continuam por realizar.
A China tem o direito de escolher a sua própria via de desenvolvimento. Porém, se China não honra os seus compromissos para servir os seus próprios interesses, em detrimento dos nossos, temos de assegurar o bem-estar dos nossos cidadãos e instar Pequim a respeitar os compromissos assumidos.
A propagação dos valores fundamentais da UE, o respeito pela dignidade humana e pelos direitos humanos, a liberdade, a democracia, a igualdade e o Estado de direito devem ser tidos em consideração num contexto asiático mais vasto, nomeadamente o contexto do Sudeste Asiático. A posição da UE pode ser reforçada através da intensificação dos laços estratégicos e da cooperação através de acordos comerciais e de investimento com os países vizinhos da China, em particular a Índia e a região ASEAN. Esta região é, em grande medida, o terceiro maior parceiro comercial da UE, devido às parcerias já estabelecidas com o Japão, Singapura, o Vietname e a Coreia do Sul. Através do aprofundamento dos laços, podemos proporcionar incentivos para uma maior integração económica que incentivará os países da ASEAN a consolidar as suas instituições democráticas e a aderir aos princípios referidos. Recordamos que a China e outros 14 países da região Ásia-Pacífico assinaram o maior acordo comercial do mundo, que reforçará a influência política e económica da China em toda a região. Acompanharemos de perto o impacto deste acordo, em particular no que diz respeito aos elementos da normalização. Mostramo-nos cautelosos quanto à compatibilidade de estratégias, como a «China Standards 2035», com o compromisso europeu assente em valores e estamos conscientes dos esforços envidados pela China para promover sistemas alternativos de governação económica e comercial.
COVID-19 – Um estudo de caso das relações UE-China
A pandemia de COVID-19 serve de estudo de caso para muitos dos desafios descritos até à data nas relações UE-China.
Na fase inicial da pandemia, a China tentou dissimular a dimensão do problema, retendo informações importantes, silenciando autores de denúncias e jornalistas na China e bloqueando decisões no Comité de Emergência da OMS. Ao optar pelo sigilo em vez de enfrentar abertamente a crise cada vez mais grave, a China permitiu que o vírus se propagasse rapidamente e se tornasse um problema mundial. Quando a COVID-19 se tornou uma prioridade para os altos dirigentes do país, todos os canais, nomeadamente as agências de comunicação social chinesas no estrangeiro, os interlocutores diplomáticos chineses e as empresas chinesas, apresentaram a China como o modelo a seguir na luta contra a pandemia. O país foi retratado como um benfeitor mundial, que enviava ajuda e equipamento médico para todo o mundo. Os meios de comunicação social estatais da China dissimularam a ajuda que o país recebeu do estrangeiro, em particular cerca de 60 toneladas de equipamento médico fornecidas pelos Estados-Membros da UE. Por outro lado, as vendas comerciais chinesas foram apresentadas como uma «ajuda chinesa aos amigos necessitados».
A diplomacia da UE foi duas vezes alvo de ingerência chinesa, sucumbindo das duas vezes à pressão chinesa. Em primeiro lugar, após uma intervenção dos diplomatas chineses, os diplomatas europeus suavizaram um relatório do grupo de trabalho de comunicação estratégica do SEAE sobre as campanhas de desinformação chinesas durante a crise sanitária. Logo depois, as agências de comunicação social chinesas exigiram que fossem realizadas alterações a um artigo conjunto do embaixador da UE na China e dos 27 embaixadores bilaterais dos Estados-Membros da UE, no que diz respeito à origem chinesa do vírus. Os diplomatas europeus optaram pela via da autocensura.
Para dissipar as críticas nacionais sobre a gestão da crise, os funcionários chineses indicaram que o vírus tinha sido introduzido no país por estrangeiros, sem, no entanto, mencionarem que estas pessoas eram, na maioria dos casos, nacionais chineses que regressavam ao país após uma estada no estrangeiro. O embaixador chinês em Londres, numa entrevista com a BBC, recusou-se a admitir que o vírus provinha da China, alegando apenas que o seu país tinha sido o primeiro a descobri-lo. Ademais, um porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês utilizou a sua conta nas redes sociais para disseminar rumores de que o vírus era, de facto, uma arma biológica americana. Os países que solicitaram uma investigação exaustiva e independente sobre a origem do vírus foram ameaçados com represálias económicas e políticas.
Enfrentamos problemas relacionados com a concorrência sistémica com a China em diferentes domínios
No que diz respeito às relações económicas, a UE e a China são interdependentes e, por conseguinte, constituem entre si mercados importantes. Porém, as empresas europeias são constantemente alvo de práticas discriminatórias, distorções de mercado e várias restrições em muitos setores económicos. No mercado chinês, as múltiplas formas de subvenções disponíveis para os concorrentes chineses – em particular as empresas públicas – distorcem ainda mais as condições de concorrência. São utilizados instrumentos semelhantes para lançar as empresas chinesas nos mercados europeus, para que compitam com as nossas empresas ou as adquiram, a fim de beneficiar das suas competências, tornando-se, posteriormente, concorrentes ainda mais fortes das restantes empresas da UE.
Outro risco que as autoridades da UE devem ter em conta é a legislação chinesa, que exige que as empresas chinesas cooperem com os serviços secretos do país. Devemos estar atentos ao risco de utilização indevida de dados por parte dos fornecedores chineses. As intervenções dos embaixadores chineses na Europa, que ameaçam os governos dos Estados-Membros com represálias contra as suas empresas estabelecidas na China, caso a Huawei não faça parte da sua rede nacional 5G, ilustram esta abordagem. Registamos as ameaças da China contra os países que criticam a situação dos direitos humanos no país ou que solicitam a realização de uma investigação internacional sobre a COVID-19, como foi o caso das restrições comerciais a diversos produtos australianos.
Por outro lado, a UE é o espaço económico mais aberto do mundo. O investimento estrangeiro é bem-vindo e contribui para o crescimento económico. O nosso sistema, com as suas sólidas regras em matéria de concorrência, investimento e contratação pública, está bem concebido e é adequado para os agentes económicos das economias de mercado liberais. Contudo, este sistema não está preparado para enfrentar os desafios colocados por uma economia impulsionada pelo Estado que oferece às suas empresas auxílios estatais que não são disponibilizados às empresas da UE e que tem a intenção de se expandir para os nossos mercados, bem como os recursos necessários para o fazer. Por conseguinte, é necessário criar condições de concorrência equitativas através de um compromisso ativo e significativo com a China. Neste sentido, O Grupo PPE congratula-se com o recente acordo de princípio relativo ao Acordo Global de Investimento UE-China. Porém, um acordo de investimento não pode, por si só, resolver todas as questões que entravam a nossa relação económica e política. De facto, é necessário garantir disposições sólidas em todos os setores, bem como mecanismos de execução para corrigir os atuais desequilíbrios e assegurar que a China e os fornecedores chineses cumpram essas disposições. Continua a ser crucial trabalhar paralelamente na adoção de medidas de acompanhamento, tanto autónomas, como de âmbito multilateral, e garantir a aplicação de regulamentos fundamentais. A melhoria do conjunto de instrumentos de defesa comercial da UE deve ser uma prioridade. O recente «Livro Branco sobre a Criação de Condições de Concorrência Equitativas no que Respeita às Subvenções Estrangeiras» da Comissão constitui um passo na direção certa, embora, ao mesmo tempo, devamos salientar a necessidade de defender os nossos princípios de abertura e de concorrência livre e leal no mercado interno da UE. No contexto do Livro Branco, apelamos à Comissão para que proponha um instrumento que garanta condições de concorrência equitativas. Este instrumento deve permitir que as empresas europeias façam concorrência às empresas chinesas que beneficiam de subvenções no ambiente competitivo do mercado único. Ademais, os instrumentos unilaterais da UE, como o previsto sistema europeu de dever de diligência para as cadeias de abastecimento ou o novo regime global de sanções da UE, devem ser aproveitados para colmatar as lacunas inevitavelmente deixadas por um mero acordo de investimento.
Recomendações políticas do Grupo PPE
A China apoiou a integração europeia quando esta facilitou o acesso das empresas chinesas ao mercado único europeu. Apoiou igualmente uma voz europeia forte, promovendo um mundo multipolar. Porém, a China utiliza estratégias bilaterais e multilaterais alternativas para contornar a abordagem geral baseada em regras praticada pelas instituições europeias. Os formatos alternativos, como o regime de investimento 17 +1 e a vontade dos Estados-Membros de maior dimensão de garantir, de forma egoísta, acordos de comércio e investimento individuais para as suas empresas, apenas favorecem a China na sua prática do princípio de «dividir para reinar» (criando uma abertura no bloco). Esta situação enfraquece a posição da UE e dos seus Estados-Membros. Uma abordagem eficaz em relação à China exige uma política externa coerente, baseada em valores e aplicada com lealdade pela UE e pelos seus Estados-Membros.
Sem uma abordagem unificada da UE que tire partido da posição negocial dos 27 Estados-Membros, dificilmente poderemos negociar em igualdade de condições com a China. O Grupo PPE apela aos Estados-Membros e às instituições europeias para que falem a uma só voz e adotem simultaneamente uma abordagem coerente e abrangente a todos os níveis. Reitera, ademais, a necessidade de reformas baseadas no mercado e de condições de concorrência equitativas para todas as empresas da UE. Deve ser criado um grupo de trabalho transversal nas instituições europeias, baseado no modelo do bem-sucedido grupo de trabalho sobre o Brexit, que foi fundamental para que os Estados-Membros se mantivessem unidos na sua posição. A UE deve reforçar as suas cadeias de abastecimento, a fim de aumentar a sua resiliência através de vários meios, nomeadamente mediante o aumento da sua própria produção e da externalização de proximidade com vista à consecução de uma «autonomia estratégica aberta».
No que diz respeito ao comércio, continuamos empenhados em manter relações abertas com a China. Infelizmente, devido à persistência de medidas não pautais injustificadas, à presença de barreiras técnicas e à falta de reciprocidade, as nossas relações comerciais continuam a ser desequilibradas. As subvenções estatais na China conduzem a sobrecapacidades e a práticas de dumping nos mercados europeus e mundiais. Embora uma abordagem puramente transacional não garanta a realização de objetivos estratégicos, a abordagem europeia de encontrar soluções através de negociações, em vez de impor direitos aduaneiros como os EUA, nem sempre se revela eficaz.
Um exemplo disso é o Fórum Mundial sobre a Capacidade Siderúrgica Excedentária, criado no âmbito da OCDE em 2016, após uma crise do aço a nível mundial provocada por uma enorme sobrecapacidade chinesa. Três anos de negociações não produziram quaisquer resultados tangíveis e a China, por fim, decidiu abandonar o Fórum em outubro de 2019. O problema da sobrecapacidade de produção de aço persiste, estando em risco 2,6 milhões de postos de trabalho diretos e indiretos na UE.
No debate público e académico europeu, Pequim está a tentar influenciar o discurso público na sociedade europeia, com vista a impor a sua própria narrativa política e censurar as vozes críticas na Europa.
A liberdade de opinião, de expressão, de religião e de associação são os princípios fundadores das nossas democracias liberais. O pensamento crítico na Europa é considerado um elemento fundamental da nossa democracia participativa. Por outro lado, para o Partido Comunista Chinês, estes princípios fundadores do nosso modelo europeu pertencem às «sete correntes subversivas» e aos «males ocidentais» que têm de ser suprimidos na China.
Ao mesmo tempo, a China utiliza cada vez mais estas liberdades na Europa para definir a sua agenda. Embora o debate transparente sobre a China nos nossos meios de comunicação social, universidades, grupos de reflexão e canais de redes sociais seja bem-vindo e enriquecedor, os meios dissimulados que servem para manipular o discurso público têm de ser combatidos.
Alguns meios de comunicação social europeus foram objeto de fusões e aquisições por parte de empresas chinesas. Por conseguinte, introduziram orientações de trabalho que favorecem a China. As receitas provenientes da publicidade e de anúncios insertos nos meios de comunicação social chineses colocados por instituições e empresas chinesas são utilizadas para promover mensagens pró-chinesas e censurar as vozes críticas. As universidades e os jornalistas da União são pressionados pelas embaixadas chinesas na Europa para que se abstenham de fazer declarações consideradas críticas em relação à China. As universidades e os grupos de reflexão europeus financiados por instituições e empresas chinesas, ou trabalhando em cooperação com estes, promovem as opiniões do Governo chinês. A vasta rede de mais de 500 Institutos Confúcio presentes em todo o mundo é também utilizada para este efeito. Além disso, tentam interferir com os programas de ensino das universidades ocidentais para censurar o discurso crítico e a investigação sobre a China. Aos investigadores e jornalistas europeus são negados vistos chineses e o acesso a fontes chinesas quando se considera que o seu trabalho é uma crítica às políticas do Partido Comunista.
Estas intervenções continuam frequentemente a passar despercebidas, mas visam os nossos valores e princípios fundamentais. Em contraste com a habitual diplomacia pública de influência (soft power), o termo «poder acutilante» (sharp power) foi cunhado para descrever esta nova diplomacia manipuladora.
A posição da UE sobre as tensões entre os Estados Unidos da América e a China
O estado das relações EUA-China tem implicações a nível mundial, nomeadamente porque a pandemia mundial agravou ainda mais as tensões existentes. A concorrência entre as grandes potências está incontestavelmente a transformar-se numa rivalidade. Nestas circunstâncias, a UE deve assumir uma posição que lhe permita defender os seus interesses, mantendo, ao mesmo tempo, uma relação de trabalho com ambos os protagonistas.
Por um lado, a UE e os EUA estão ligados pela sua relação transatlântica – institucionalizada na NATO – que se baseia nos princípios da democracia, da liberdade, dos direitos humanos e do Estado de direito. O Grupo PPE está empenhado em renovar e reforçar este vínculo. Há trinta anos que a UE apoia lealmente os Estados Unidos, mantendo o seu embargo de armas à China. Por outro lado, o mercado chinês, com todas as reservas existentes, é um poderoso íman, atraindo empresas europeias de todas as dimensões.
Apenas a UE no seu conjunto oferece aos seus Estados-Membros a possibilidade de preservar a sua autonomia perante a luta pela primazia que ocorre entre os EUA e a China. Para não ser pressionada pelos dois gigantes geopolíticos, a UE deve manter uma política externa baseada em princípios, mas também pragmática. A defesa do multilateralismo e das suas instituições, bem como o respeito da ordem assente em regras são fundamentais para defender a posição da UE. Tal implica a imposição de sanções para defender os interesses europeus.
Esta situação pode conduzir a recuos ou desilusões temporários, como eventuais represálias por parte de Pequim contra os nossos interesses comerciais. Porém, a longo prazo, reforçará o sistema internacional com base em regras transparentes. Para alcançar este objetivo, a UE tem de assumir a liderança na reconstrução da sua aliança com os Estados Unidos. O mesmo deve ocorrer com outros Estados democráticos ou ideologicamente similares que desconfiem da forma como a China demonstra ser seletiva no cumprimento das regras internacionais.
O Grupo PPE congratula-se com o estabelecimento do Diálogo UE-EUA sobre a China e apela a um debate sólido sobre domínios como a transferência forçada de tecnologia ou o reforço das instituições multilaterais, em que uma abordagem comum é não só desejada, mas também necessária. O Grupo PPE solicita, ademais, que a UE, os EUA e outros países democráticos prossigam uma agenda ambiciosa de apoio à democracia em todo o mundo, a fim de lutar contra o autoritarismo crescente, apoiar o desejo de liberdade dos cidadãos e reforçar a resiliência democrática.
Em função dos resultados destes esforços, as relações entre a UE e a China podem desenvolver-se de acordo com três cenários diferentes:
a) Cenário positivo – empenho e cooperação
Num cenário positivo, ambas as partes continuam a cooperar. Esta situação permite à UE dialogar com os EUA e com a China, celebrar acordos, aumentar o comércio e reforçar o nível de investimento. Os três parceiros trabalham em concertação no sentido de enfrentar os desafios globais, nomeadamente as alterações climáticas, o terrorismo e a atual pandemia. O diálogo regular é acompanhado por um elevado nível de confiança.
b) Cenário neutro – coexistência e improvisação
A União Europeia aceita os pontos fortes dos seus parceiros e empenha-se em reforçar os seus próprios pontos fortes. A União está consciente do aumento da concorrência e envida esforços no sentido de lutar contra as práticas comerciais desleais, o que não prejudica completamente as relações, uma vez que todas as partes reconhecem que têm mais a ganhar do que a perder.
c) Cenário negativo – rivalidade e conflito
O terceiro cenário apresenta as consequências mais graves. Num ambiente hostil caracterizado por uma quebra de confiança, em que o comércio é dificultado e abundam medidas de retaliação, a UE necessita de encontrar meios para manobrar e agir com destreza.
Os cidadãos europeus não aceitariam um confronto militar. Apenas uma União Europeia forte e unida poderá impedir a China de nos intimidar para participar num tal confronto. A força é definida por uma política externa eficaz e assertiva, no espírito do artigo 24.º, n.º 3, do TUE. A UE tem de estar disposta a aproveitar plenamente a sua posição influente (forte agente económico, principal doador de ajuda, parceiro político de confiança, exportador de um modelo de integração específico). A unidade implica uma posição unificada em relação à China e aos EUA, em que os interesses a curto prazo e individuais não prevaleçam sobre o interesse geral. Em relação à China, a Europa deve, por definição, tirar partido do seu poder muito mais vasto de negociação coletiva.
A UE deve preparar-se para uma possível rutura das relações entre os EUA e a China. Nesse sentido, a UE deve ser autossuficiente em setores-chave da economia, alterando a natureza das cadeias de abastecimento (aproximando-as de casa) e aumentando significativamente o investimento em investigação e desenvolvimento. A UE poderá não ser capaz de pôr termo às ações chinesas, mas deve garantir que as mesmas têm um determinado preço. Os esforços com vista a reequilibrar as relações com a China devem ter em conta a aplicação determinada da reciprocidade, os mecanismos de análise dos investimentos, as restrições à aquisição de empresas europeias sensíveis e as infraestruturas estratégicas, nomeadamente nos domínios da agricultura, do imobiliário e da tecnologia. Além disso, as medidas restritivas (ou seja, o regime global de sanções) devem ser sempre uma opção disponível. Uma defesa determinada da liberdade e da democracia aumenta a capacidade da UE para enfrentar melhor os esforços sistemáticos da China para influenciar os seus políticos e a sociedade civil, com o objetivo de moldar a opinião pública em consonância com os interesses estratégicos da China. Ademais, a UE deve denunciar as táticas e ações predatórias da China em países terceiros vulneráveis, que são atraídos pela promessa, por exemplo, da iniciativa «Uma Cintura, uma Rota», acabando por ser apanhados na armadilha da dívida (dívidas de ativos).
Um diálogo renovado entre a UE e os EUA sobre a China – centrado nos aspetos políticos, de segurança, estratégicos e económicos – poderia servir de plataforma para a UE e os EUA compreenderem melhor e moderarem as respetivas abordagens em relação a Pequim, evitando uma escalada desnecessária das relações EUA-China. Os dirigentes europeus devem ter em conta que a política norte-americana em relação à China é uma das poucas questões da política americana em que é possível alcançar um consenso bipartidário.
A relação transatlântica, independentemente de quão estreitas possam vir a ser as nossas relações com a China, é e será sempre mais forte e mais importante para a UE. A crença na liberdade e na democracia liga-nos aos EUA, que é um aliado crucial nas relações com a China.
Conclusões A política da UE em relação à China deve basear-se nos seguintes princípios: cooperar sempre que possível; competir sempre que necessário; confrontar sempre que inevitável. Esta abordagem permite à UE reagir com flexibilidade à evolução da relação bilateral.
Porém, uma relação exige um interesse de ambas as partes e o respeito das regras existentes. Esperamos, por conseguinte, que a China cumpra os seus próprios compromissos. A aplicação seletiva da ordem internacional assente em regras é inaceitável. Esperamos das autoridades chinesas não discriminação e abertura, bem como a disponibilidade para assumirem a responsabilidade e serem responsabilizadas, o que decorre do seu papel reforçado na cena mundial.
O Grupo PPE apoia uma relação com a China que seja prática, pragmática e baseada em princípios. A UE não deve comprometer os seus valores e princípios. O Grupo PPE insta as instituições europeias e os Estados-Membros da UE a utilizarem todos os meios para persuadir os dirigentes chineses a transformar o seu inspirador país num membro responsável da comunidade internacional.
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